domingo, 2 de maio de 2010

O segredo das antenas

Partículas dessa estrutura captariam campo magnético terrestre que orienta migração de formigas

Por: Thaís Fernandes

Publicado em 20/05/2009 | Atualizado em 13/10/2009


A Pachycondyla marginata é uma formiga migratória preta de cerca de 1 cm de comprimento encontrada no Brasil e em outros países da América do Sul. Essa espécie usa o campo geomagnético da Terra para se orientar (fotos: RobertoEizemberg).


Um estudo com pesquisadores brasileiros publicado esta semana no Journal of the Royal Society Interface pode ajudar a compreender um processo ainda misterioso: a influência do campo geomagnético da Terra sobre a orientação dos animais. A análise das antenas de uma espécie de formiga migratória revelou quantidades de partículas magnéticas que poderiam funcionar como sensores para detecção desse campo.

O campo geomagnético terrestre é semelhante ao gerado por um ímã cujos polos estariam próximos aos polos geográficos da Terra. Esse campo é detectado pelos animais e transformado em sinais neurais, que são levados para o cérebro pelosistema nervoso. A informação magnética do grande “ímã” terrestre pode ser usada então para orientação espacial.

Esse processo, chamado magnetorrecepção, tem sido bastante estudado em vários grupos de animais. Mas os mecanismos pelos quais o campogeomagnético é percebido e transmitido ao sistema nervoso ainda sãodesconhecidos.

Os novos dados reforçam a hipótese de que essa sensibilidade ao campo se deve à presença de partículas magnéticas em estruturas conectadas ao sistema nervoso dos animais. A pesquisa é fruto do doutorado da física Jandira Oliveira noCentro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e contou com a colaboração da Universidade Técnica de Munique (Alemanha).

Formigas P. marginata deixam um ninho de cupins carregando uma presa. Os exemplares usados na pesquisa foram coletados na Mata de Santa Genebra, uma reserva em Campinas (São Paulo).

A equipe analisou antenas de formigas migratórias da espécie Pachycondyla marginata, que se alimentam exclusivamente de cupins da espécieNeocapritermes opacus. Essa migração é orientada em ângulos de 13º em relação ao eixo geomagnético norte-sul da Terra e ocorre em geral no fim da tarde, quando seria mais difícil detectar características da paisagem que pudessem auxiliar no deslocamento, o que pressupõe a influência do campo magnéticoterrestre.

“A escolha das antenas para a análise não foi feita ao acaso”, diz à CH On-line a biofísica Darci Motta Esquivel, co-orientadora da pesquisa no CBPF. Resultados de estudos anteriores realizados pelo grupo já tinham apontado essas estruturas como candidatas promissoras a órgão sensorial para a magnetorrecepção.

Os pesquisadores investigaram três minúsculos pedaços das antenas dasformigas que estão conectados ao sistema nervoso do inseto: um localizado na base da estrutura e dois nas junções de seus segmentos. Essas partes – que medem 0,1 mm cada – foram inseridas em blocos de resina, divididas em 300 mil pedaços e observadas por meio de um microscópio eletrônico de transmissão.

Partículas magnéticas
“Detectamos vários tipos de óxido de ferro, que são materiais magnéticos, juntocom partículas não magnéticas, como alumínio e silício”, conta Oliveira. Na avaliação da pesquisadora, “as quantidades de partículas magnéticas encontradaso suficientes para funcionar como sensores e permitir a magnetorrecepção nesses insetos”.

Clique na imagem para assistir a um vídeo que mostra as formigas P. marginata atacando um cupinzeiro em busca de alimento (imagens: RobertoEizemberg).

Segundo a orientadora da pesquisa, a biofísica Eliane Wajnberg, do CBPF, além de terem sido detectadas dentro do tecido das antenas das formigas, essas partículas magnéticas também são encontradas no solo. “Esse material foi incorporado pelos insetos”, explica.

A descoberta de óxidos de ferro nas antenas das formigas chama a atenção dos pesquisadores para materiais magnéticos que até entãoo eram apontados como possíveis componentes do mecanismo de magnetorrecepção. “Esperávamos encontrar cristais de magnetita, o material mais fortemente magnético e presente em abundância na natureza”, diz Wajnberg.

A equipe do CBPF pretende agora realizar novas pesquisas para verificar se os óxidos de ferro estão realmente funcionando como sensores do campogeomagnético da Terra e se eles estão presentes nas antenas de outros tipos de insetos.


Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line
20/05/2009



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